Crítica: Periféricos – 1ª Temporada

The Peripheral, EUA, 2022



Prime Video · Trailer · Filmow · IMDB · RottenTomatoes

★★★☆☆


Há ótimos personagens, atuações, ideias, cenas de ação e efeitos especiais na primeira temporada de Periféricos. Porém, a marca registrada da série é sua inconsistência, com alguns momentos muito mais inspirados do que outros. Mesmo os bons momentos são prejudicados pelo excesso de ideias e personagens, se perdendo em um emaranhado de narrativas. Dessa forma, a trama consegue levantar alguns interessantes questionamentos, ainda que não se aprofunde na maioria deles.

periféricos 1

Em termos de atuação, os grandes destaques são Chloë Grace Moretz e Jack Reynor, que tornam os irmãos Flynne e Burton Fisher extremamente verossímeis. Mesmo em momentos nos quais o roteiro não colabora, as interações entre os dois conseguem evitar que o espectador perca o interesse na trama. O mesmo vale para personagens como Corbell Pickett (Louis Herthum), Cherise Nuland (T’Nia Miller), Aelita West (Charlotte Riley) e a inspetora Ainsley Lowbeer (Alexandra Billings). Já Wilf Netherton (Gary Carr), que é um dos personagens centrais, acaba sendo um dos elos fracos da produção.

Clique para comprar

Na trama, Flynne, que mora com sua família no sul dos EUA em 2032, aceita participar de um jogo de realidade virtual que altera completamente a sua vida. O que ela acredita ser o universo do “jogo” na verdade é a Londres de 2099; e o que ela acredita ser seu “personagem” na verdade é um androide – chamado de “periférico” – que ela consegue controlar a partir do passado. Na prática, ela o controla de uma linha do tempo alternativa, já que a partir do momento no qual há comunicação entre o futuro e o passado, um ramo temporal é criado e começa a divergir.

As ideias exploradas aqui poderiam resultar em tramas tão intrigantes e misteriosas quanto as de Devs ou Outer Range, que são mais focadas no drama e no suspense. Porém, Periféricos também está bastante interessada em ser uma série de ação, o que dificulta ainda mais o equilíbrio entre seus muitos elementos. O ideal seria que a trama conseguisse equilibrar ação e ficção científica tão bem quanto séries como The Boys e Westworld, mas esse não é o caso.

Para se ter uma ideia, a trama lida com temas como traumas de veteranos de guerra, corrupção de autoridades locais e nacionais, o poder “mafioso” de oligarcas russos e os impactos de guerras, pandemias e mudanças climáticas sobre a sobrevivência da humanidade. Todos esses temas são bem relevantes para a nossa era, com acontecimentos como a Guerra na Ucrânia, a pandemia de coronavírus e os efeitos do aquecimento global dominando os noticiários.

Porém, equilibrar todos esses temas com várias cenas de ação, alguns dramas de família e uma trama sobre viagem no tempo não é algo fácil de se fazer em apenas oito episódios. Dada a ousadia e o escopo dessa empreitada, Periféricos até chega perto de ser algo realmente memorável.

periféricos 2

Uma mostra disso é como alguns dos personagens e temas secundários poderiam ser os centros de suas próprias séries. Por exemplo, o flashback que mostra o reencontro entre Aelita e Grace (Amber Rose Revah) possui diálogos, atuações e uma ambientação neo-noir dignos de uma produção de romance e suspense focada apenas nas duas personagens. O mesmo vale para a estilosa e inteligente inspetora Lowbeer e para o super-assassino irlandês Bob (Ned Dennehy), que parece ter saído diretamente de um filme de John Wick.

Há ainda as complexas intrigas políticas inerentes à frágil e violenta ordem mundial pós-apocalíptica de 2099, protagonizadas pelo oligarca Lev Zubov (JJ Feild) em seus conflitos contra os grupos representados por Cherise, que é líder do Instituto de Pesquisa, e Lowbeer, membro da Polícia Metropolitana de Londres. A série também poderia ir mais fundo nas implicações do uso de realidade aumentada para se alterar a percepção das pessoas sobre os espaços urbanos e nas implicações éticas do uso de ramos temporais alternativos como cobaias para novos medicamentos e novas tecnologias.

Algo que Periféricos faz muito bem é a representação de um “evento” apocalítico. Semelhante à maioria das extinções em massa que ocorreram no passado, não foi apenas um evento específico que causou uma drástica redução da população humana ao longo do Século 21. As mudanças climáticas que já conhecemos se combinam com eventos emblemáticos (como um mega ataque cibernético nos moldes das preocupações levantadas no documentário A Arma Perfeita, um ataque terrorista de proporção nuclear e uma pandemia causada por um terrível filovírus) para causar o colapso da agricultura e a morte de sete bilhões de pessoas ao longo de quatro décadas.

Ao que tudo indica, a humanidade da série concretizou a extinção em massa do Holoceno, evento de extinção teoricamente causado pela ação humana e que ainda não é amplamente aceito pelos estudiosos.

Todas essas ousadas ideias são prejudicadas por algumas subtramas desnecessárias e por momentos nas quais as atitudes ou reações de alguns personagens não fazem muito sentido. Em alguns momentos, os personagens estão lidando com conceitos científicos altamente inteligentes e avançados; em outros, eles estão falando e fazendo coisas inexplicáveis, com o único objetivo de forçar o início de uma cena de ação ou de um momento artificialmente romântico. Se os roteiros superarem essas limitações em uma segunda temporada, Periféricos pode estar destinada à grandiosidade.

Siga ou compartilhe: