Crítica: Carol e o Fim do Mundo

Carol & the End of the World, EUA, 2023



Netflix · Trailer · Filmow · IMDB · RottenTomatoes

★★★★☆


À primeira vista, Carol e o Fim do Mundo nos lembra que pessoas diferentes teriam diferentes reações diante da certeza da extinção da humanidade. Porém, o que a minissérie da Netflix realmente ressalta é que as pessoas em geral possuem diferentes experiências de vida e diferentes formas de serem felizes. Com uma premissa semelhante à do filme Melancolia e com uma abordagem que possui vários paralelos com a série Bojack Horseman, a produção oferece uma experiência reconfortante e contemplativa sobre a condição humana.

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O mundo no qual encontramos Carol Kohl (Martha Kelly) já passou pela pior fase do desespero apocalíptico. Com os saques e o caos generalizado já sob controle, o que resta são pessoas tentando viver a vida ao máximo antes do inevitável fim. A protagonista, entretanto, se sente perdida e não sabe exatamente o que fazer. Isso até ela encontrar seu oásis: a “Distração” não é nada mais que o departamento de contabilidade de uma grande empresa, que inexplicavelmente continua funcionando à todo vapor mesmo diante do fim.

Para algumas pessoas, viver a vida ao máximo significa ter experiências sensoriais: pular de paraquedas, fazer muito sexo, dirigir em altas velocidades, usar drogas, festejar como se não houvesse amanhã, etc. Há aqueles que irão preferir experiencias mais espirituais ou mesmo holísticas. Outros vão ficar até o último minuto tentando dar algum jeito mirabolante de sobreviver, enquanto há também aqueles que vão tentar garantir, de alguma forma, a sobrevivência da espécie.

Porém, Carol prefere o conforto de uma rotina previsível, o que inclui as sexta-feiras de happy hour com os colegas de trabalho. Enquanto sua família e amigos a pressionam para que ela seja feliz com as mesmas coisas que os fazem felizes, ela encontra satisfação realizando o trabalho de assistente administrativa em uma empresa qualquer. Enquanto seus entes queridos possuem sufocantes expectativas sobre como sua vida (e sua felicidade) deveria ser, ela segue um caminho bem menos óbvio.

Talvez ela esteja entre aquelas pessoas para as quais viver a vida ao máximo significa encontrar um senso de propósito. Talvez ela encontre prazer em empreender um esforço sistemático até atingir um determinado resultado; ou, pelo menos, ter essa ilusão. Talvez não seja uma questão de atingir um resultado, mas sim de apreciar a jornada.

Como ressaltado na segunda temporada de O Urso, diante das incertezas da vida, esse senso de propósito pode ser encontrado de muitas formas diferentes. É tudo uma questão de “tempo bem gasto”. E, nesse sentido, cada segundo importa.

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Graças ao seu trabalho na Distração, Carol sabe exatamente o que fazer quando acorda pela manhã. Ao invés de tentar decidir como vai passar o dia, ela já sabe exatamente o que precisa vestir e onde precisa estar. Ao invés de pensar no iminente fim do mundo, ela pensa em encontrar seus colegas de trabalho e em passar o dia na companhia deles. Para ela, esse senso de propósito lhe dá um motivo para se levantar da cama pela manhã e seguir sua previsível rotina.

No drama pós-apocalíptico The Rover: A Caçada, a falta de propósito é justamente um dos elementos que aterrorizam o protagonista. Diante da desesperança generalizada, ele pergunta: “O que você sente quando acorda pela manhã? Quando seus pés tocam o chão… ou antes disso, quando você está deitado lá, pensando no momento em que seus pés tocarão o chão… o que é que você sente?”

Em Carol e o Fim do Mundo, esse terror é vivido por Eric (Michael Chernus). Ele é um pai solteiro que, depois de conhecer Carol, deposita nela todas as suas esperanças de felicidade. De repente, ele se torna mais uma pessoa colocando pressão sobre a protagonista, como se ela tivesse a obrigação de servir como alicerce para sua vida. Em sua própria jornada de dúvidas e inseguranças, ele demora para perceber que, ao invés de buscar alicerces em outras pessoas, é bem mais importante que ele seja um alicerce na vida do seu filho.

No fim das contas, todos os personagens de Carol e o Fim do Mundo, por mais diferentes que sejam, estão em busca de conexões humanas. Sejam os esportistas radicais, os festeiros ou os trabalhadores de escritório, todos eles querem passar os últimos dias da humanidade fazendo o que gostam ao lado das pessoas que gostam. Ainda que também curtam alguns momentos de solitude, nenhum deles está interessado em uma completa solidão.

Apesar da apocalíptica ambientação de Carol e o Fim do Mundo inspirar pensamentos e terrores existenciais, a trama da minisérie é muito mais uma afirmação da vida e do que há de positivo na experiência humana. E apesar de fazer mais desvios do que o necessário, a narrativa ainda é extremamente satisfatória e extraordinariamente original. Pertinentemente, essa história não é para todos os gostos, e nem precisa ser.

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