Homem-Aranha: 20 Anos no Cinema
Quando Homem-Aranha (2002) foi lançado nos cinemas, eu, do alto dos meus quase dezessete anos de idade, não fiquei lá muito impressionado. Por uma lado, era fantástico ver o herói que eu já conhecia dos quadrinhos e da série animada em uma aguardada versão live action. Por outro, a história apresentada era a mais básica possível, mostrando a origem do super-herói e seu primeiro confronto com o Duende Verde. Era uma trama que não apresentava nenhuma surpresa para quem já conhecia os personagens, mas que foi ótima para introduzi-los a uma nova legião de fãs.
Nos anos anteriores, havia um Homem-Aranha bem diferente nos quadrinhos. Embalado pela série animada, eu havia começado a comprar as revistas em formatinho justamente quando Ben Reilly era o Homem-Aranha oficial. Ele havia assumido o manto depois da Saga do Clone, que terminou com a revelação de que o Peter Parker que sempre conhecemos era um clone do Peter Parker original. Esse original havia assumido o nome de Ben Reilly, aparecendo inicialmente como o Aranha Escarlate e posteriormente se tornando o Homem-Aranha (ambos na imagem ao lado). Um tempo depois, a troca foi desfeita e ficou claro que Reilly era o clone e que o nosso Peter Parker sempre foi o original.
A questão é que essas histórias tinham a cara e a “pegada” do final dos anos 1990. O primeiro filme basicamente apresentava o Homem-Aranha (Tobey Maguire) dos anos 1960 em uma história ambientada no início dos anos 2000, o que o deixava um pouco deslocado. Foi apenas com Homem-Aranha 2 que o personagem realmente foi adaptado para o período contemporâneo, especialmente ao apresentar uma história mais madura e um vilão mais interessante, o Doutor Octopus de Alfred Molina. Para muitos, esse ainda é o melhor filme do Homem-Aranha, especialmente por apresentar fantásticos arcos dramáticos tanto para o herói quanto para o vilão.
Já Homem-Aranha 3 errou justamente no arco dramático e nos vilões. As cenas que mostram o personagem se entregando ao seu lado mais sombrio deveriam ser tensas e assustadoras, mas foram marcadas acima de tudo pela comédia e pela vergonha alheia. Além disso, o filme tentou acomodar mais vilões do que o ideal, cada um passando por seu próprio drama. O resultado foi uma bagunça que eu preferi apagar do minha memória até recentemente, quando assisti ao filme novamente. O maior “crime” da produção foi ter desperdiçado Venom, um vilão que rendeu alguns dos melhores arcos da série animada.
Apesar de Homem-Aranha 2 ser muito bom, O Espetacular Homem-Aranha apresentou exatamente o Homem-Aranha que eu sempre quis ver na tela grande. Mais ágil e engraçado, essa é a versão do personagem que mais se aproxima tanto da série animada quanto dos quadrinhos. O bom humor durante as batalhas sempre foi um dos pontos fortes do personagem, mas havia ficado em segundo (ou terceiro) plano nos filmes anteriores. Além disso, o Peter Parker de Andrew Garfield tinha uma personalidade menos passiva e mais descontraída, apesar de também lidar com pesados acontecimentos dramáticos.
O problema dessa versão do Homem-Aranha é que seus filmes não estavam apenas tentando contar uma boa história, mas também construir uma grande franquia cinematográfica. Isso se agravou em O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro, que, além do longo título, também exagerou nos vilões e nos mistérios sobre o passado de Parker. A confusa história preparava um eventual filme do Sexteto Sinistro e sabe-se lá mais o quê, mas a baixa bilheteria e outros fatores levaram ao cancelamento da nova franquia. Porém, nada disso altera o fato de que Garfield deu vida à versão cinematográfica mais fiel ao Homem-Aranha dos quadrinhos.
Para a Sony Pictures continuar sendo a detentora dos direitos de adaptação do Homem-Aranha para o cinema, ela precisa produzir pelo menos um filme a cada cinco anos. Por isso, com ou sem a participação do MCU, o estúdio provavelmente continuaria fazendo filmes com o personagem e seus vilões. Felizmente, a Sony Pictures e a Marvel Studios chegaram a um frágil e lucrativo acordo, apesar de ficar claro que cada um dos lados preferia estar faturando essa grana sozinho.
E assim o Homem-Aranha (Tom Holland) fez sua estreia no MCU em Capitão América: Guerra Civil. A participação foi seguida do primeiro filme solo dessa nova encarnação do herói, Homem-Aranha: De Volta ao Lar (crítica aqui), título que faz referência ao retorno do personagem para o amplo universo Marvel. Ele voltou com um papel central em Vingadores: Guerra Infinita (crítica aqui) e uma participação especial em Vingadores: Ultimato (crítica aqui). Dessa forma, esse é o primeiro Homem-Aranha que traz para o cinema uma importante característica do personagem: suas divertidas e inusitadas interações com outros super-heróis.
O tom mais leve e adolescente dessa nova versão tinha tudo para dar errado, especialmente por misturar um Peter Parker jovem e inexperiente com um Homem-Aranha em seu modo “Vingador”. Porém, as tramas de Guerra Civil e De Volta ao Lar acertaram ao fazer de Tony Stark/Homem de Ferro (Robert Downey Jr.) um mentor para o personagem, apresentando uma dinâmica tão divertida quanto dramaticamente rica. Além disso, o clima de comédia adolescente ajuda o MCU a dar uma variada em sua fórmula.
Isso chegou ao seu ápice em Homem-Aranha: Longe de Casa (crítica aqui), filme que poderia muito bem se chamar “As Férias Frustradas do Homem-Aranha”. Em um momento no qual pretendia apenas se divertir e ser um adolescente normal, Parker precisa lidar com aliados e inimigos que o veem como muito mais do que um adolescente. O filme também consolida essa versão do herói como a mais poderosa que já chegou ao cinema, seja por seu uso das tecnologias de Stark ou por seu grupo de apoio, formado por Mary Jane (Zendaya), Ned (Jacob Batalon) e Happy (Jon Favreau).
Em Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa, o herói vai ter que mais uma vez lidar com o Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch), além de enfrentar ameaças que vêm de outros universos. Espera-se que as participações de Tobey Maguire e Andrew Garfield nesse próximo filme se concretizem e expandam o universo cinematográfico do Homem-Aranha para territórios ainda inexplorados. Isso já foi muito bem feito em Homem-Aranha no Aranhaverso (crítica aqui), que é um dos melhores filmes sobre o personagem, e espera-se que as próximas produções pelo menos tentem reproduzir a qualidade dessa animação.