Crítica: Oslo
Oslo, EUA, 2021
Filme é bem-sucedido em mostrar os sentimentos e as complexidades envolvidas no conflito entre Israel e o povo palestino
★★★☆☆
O diretor Bartlett Sher e o roteirista J.T. Rogers, que também é o autor da peça original, fazem o máximo possível para injetar tensão e movimento à narrativa de Oslo, mas esse é um filme sobre negociações de paz realizadas principalmente em uma única sala. Eles até são bem-sucedidos, preenchendo de forma satisfatória as quase duas horas de duração do filme. Entretanto, o limitado escopo da trama evita que a produção atinja notas mais altas, limitando-a a ser muito interessante e extremamente informativa.
No centro de Oslo está o casal formado por Mona Juul (Ruth Wilson) e Terje Rød-Larsen (Andrew Scott), uma diplomata e um sociólogo noruegueses que, entre 1992 e 1993, colocam em movimento a série de reuniões que daria origem aos Acordos de Oslo. O filme segue todo o processo, do momento em que cada um deles propõem uma reunião inicial a cada um dos lados, passando por todas as fases de negociação e finalmente chegando na assinatura dos documentos. Isso permite que a narrativa mostre o quão cansativa e detalhada pode ser a negociação de um acordo de paz e o quanto os envolvidos estavam dispostos a se dedicar a essa tarefa.
Esses acordos representaram uma das primeiras sinalizações de paz depois de décadas do conflito israelo-palestino, mas acabariam falhando em seu objetivo principal. Eles foram bem-sucedidos em mostrar que negociações de paz eram possíveis e que os representantes dos dois lados estavam dispostos a fazer concessões em nome da paz. No filme, é possível ver como os dois lados foram capazes de colocar as cartas na mesa e apresentar os próprios pontos de vista. Alguns assuntos mais espinhosos foram evitados, mas as conversas seguiram de forma franca, com o objetivo de se chegar a um consenso.
O grande problema é que esse frágil consenso foi atingido à portas fechadas, sem a participação de todas as organizações políticas e cidadãos dos dois lados. A consequência disso é que os acordos foram mal recebidos pela opinião pública, já que boa parte das duas populações não estavam dispostas a deixar de lado as questões espinhosas e nem a fazer concessões. Em 1995, o primeiro-ministro israelense Yitzhak Rabin, que havia recebido um Nobel da Paz pelos acordos de Oslo, foi assassinado por um israelense de extrema-direita que se opunha aos tratados.
O filme é muito bem-sucedido em apresentar os pontos de vista do conflito. Enquanto o diplomata israelense Uri Savir (Jeff Wilbusch) reforça a importância de se garantir a segurança do povo judeu depois de muitos séculos de perseguição, o negociador palestino Ahmed Qurei (Salim Dau) conta a história de como, em 1948, seu pai foi removido da própria casa para dar lugar às colônias do recém-criado Estado de Israel.
Essa interação resume as origens do conflito: em 1948, a ONU ofereceu parte do território palestino para que os judeus formassem seu próprio Estado; a única “inconveniência” é que o território já estava ocupado por povos árabes há muitos séculos, já que a maioria dos judeus haviam deixado a região durante as grandes diásporas. Israel seguiu então a lógica colonialista que ainda reinava na época, e que foi destrinchada na série documental Extermine Todos os Brutos (resenha aqui): remover ou subjugar a população nativa e ocupar o território.
É claro que os israelenses se consideram os verdadeiros nativos daquela região. É como se os EUA ocupassem uma parte do território brasileiro e, depois de um tempo, permitissem que as populações indígenas criassem um novo país ali, dando-as, inclusive, o direito de expulsar os brasileiros não-indígenas da região. Isso certamente seria considerado injusto pela maioria dos brasileiros, especialmente pelas famílias que já estão há várias gerações no território ocupado, enquanto os indígenas que acabaram de ganhar o próprio país se veriam na obrigação de defendê-lo com unhas e dentes.
Desde o fracasso dos acordos, a violência na região só piorou, aumentando ainda mais o ressentimento entre os dois lados e diminuindo as chances de negociação. Oslo mostra que muito do sucesso da negociação ocorreu graças ao estabelecimento de conexões pessoais entre os negociadores, que passaram a enxergar o outro lado não apenas como inimigos a serem destruídos, mas sim como seres humanos a serem ouvidos. Isso é algo muito difícil de se fazer em larga escala, já que civis dos dois lados têm sido vítimas dos atentados terroristas e das ações militares promovidas pelos dois lados. Ainda assim, a trama mostrada no filme realça a importância de se tentar o impossível em nome de um processo de paz.