Crítica: O Dono de Kingstown – 4ª Temporada

Mayor of Kingstown – Season 4, EUA, 2025



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★★★★☆


Desde os primeiros episódios da primeira temporada fica claro que os personagens de O Dono de Kingstown estão sempre correndo o risco de serem engolidos pela violência da realidade na qual eles vivem. A série sempre foi marcada por tragédias tão sombrias quanto pessimistas, expondo os perigos que ameaçam tanto os personagens quanto a sociedade em geral. Agora, a quarta temporada os mergulha ainda mais fundo nessa espiral de violência e concretiza alguns dos piores pesadelos de alguns dos personagens. O resultado é a melhor, mais tensa e mais perturbadora temporada da série até agora.

mike e a diretora hobbs em o dono de kingstown

A fórmula de O Dono de Kingstown já dava sinais de cansaço na terceira temporada, mas, felizmente, seus episódios finais sacudiram significativamente o status quo da trama. Personagens como Milo (Aidan Gillen), Iris (Emma Laird) e o diretor Kareem Moore (Michael Beach) já não estão presentes, o que abriu o caminho para a introdução do gangster Frank Moses (Lennie James), da diretora de presídio Nina Hobbs (Edie Falco) e da agente penitenciária Cindy (Laura Benanti) na temporada atual.

Porém, uma das maiores novidades é o fato de que o policial Kyle McLusky (Taylor Handley) está agora atrás das grades por ter atirado no colega Robert Sawyer (Hamish Allan-Headley). Isoladamente, essa situação já é suficiente para testar a influência do protagonista da série, Mike McLusky (Jeremy Renner), uma vez que a diretora Hobbs não dá sinais de que vai ajudá-lo a manter seu irmão Kyle seguro dentro da prisão. Como se isso não bastasse, Kyle é colocado na cela ao lado de Merle Callahan (Richard Brake), que é uma figura de liderança na Irmandade Ariana e também um antigo desafeto de Mike.

Dentre todos esses personagens, talvez o mais afetado pelo ciclo de violência seja Robert. Membro da unidade SWAT da polícia local, ele executou inúmeros criminosos desde a primeira temporada da série, muitas vezes em condições altamente questionáveis mesmo sob seu distorcido senso de justiça. Porém, depois de ser violentamente atacado na segunda temporada e ter se tornado cada vez mais instável ao longo da terceira, ele se encontra suspenso do serviço e na mira da promotora Evelyn (Necar Zadegan).

Robert ainda se vê como o cara “ponta firme” que garante o lado dos colegas e aliados, quando na realidade ele acabou se tornando o grande elo fraco do grupo. A questão é que depois de cometer tantos assassinatos supostamente justificáveis, a linha entre o justificável ou não se tornou completamente incerta para ele. Ele pode ter começado executando perigosos criminosos nas ruas, mas agora qualquer um que ofereça qualquer tipo de ameaça ou que ele ache que não está colaborando o suficiente pode se tornar “justificável”, por mais inocente que a pessoa seja.

Para Robert, matar pessoas não apenas se tornou muito fácil, como também se tornou seu principal método de “resolução” de problemas. Ele ainda se vê como um “herói” e acredita que a justiça não tem o direito de processá-lo. Ainda assim, sua indignação é parcialmente justificada, já que ele é apenas um dos participantes do núcleo de corrupção formado por Mike, Kyle, Ian (Hugh Dillon) e Stevie (Derek Webster).

Dentre eles, Ian vem se tornando um dos personagens mais perigosos desde a segunda temporada. Sem avisar aos outros, ele vem tomando atitudes cada vez mais violentas e ardilosas contra as testemunhas e as autoridades que o colocam na mira da justiça. Seu instinto de autopreservação acaba sendo uma das forças mais ameaçadoras de O Dono de Kingstown, sendo impossível prever quem ele seria capaz de atacar para se manter fora da prisão. A rigor, nem Mike estaria seguro diante do desespero desse personagem.

moses e mike em o dono de kingstown

Já as chegadas de Moses e Hobbs na trama, junto com um aumento nas atividades de um cartel mexicano, complicam significativamente a vida de Mike como “prefeito” de Kingstown. O cartel é representado principalmente pela chegada do sicário Cortez (Derek Rivera), um assassino extremamente (ou exageradamente) competente e resiliente, com fortes sinais de que ele possui um treinamento militar de elite. Já o poderoso Moses, que é um chefão intocável em Detroit (maior cidade do Michigan, estado onde a fictícia Kingstown é localizada), começa uma promissora parceria com o traficante de drogas Bunny (Tobi Bamtefa), prometendo expandir suas atividades criminosas para além da cidade.

Tudo isso faz com que a trama da quarta temporada de O Dono de Kingstown ganhe características mais comuns em séries de espionagem, como as recentes A Agência e A Fronteira Oriental. Há aqui tensas “negociações diplomáticas” e traições, além de um “jogo de espiões” marcado por pessoas infiltradas, por técnicas de manipulação e por episódios de violência. Em muitos aspectos, os ativos mais importantes que muitos dos personagens podem ter são influência e informações, e é por isso que Mike está quase sempre no centro da trama.

Já a crescente presença do cartel de drogas lembra outras séries de Taylor Sheridan, como Landman e a segunda temporada de Operação Lioness. Sheridan já não está tão próximo da produção de O Dono de Kingstown (ele não escreveu nem dirigiu nenhum dos episódios da terceira e da quarta temporadas), deixando a série sob a responsabilidade do showrunner Dave Erickson e do co-criador Hugh Dillon (que também interpreta Ian na série). Eles terão que lidar com as pontas soltas que essa temporada deixou tanto em relação ao cartel quanto em relação a Moses.

As novidades inseridas tornam a quarta temporada da série insuportavelmente tensa e imprevisível, deixando o espectador apreensivo durante a maior parte do tempo. Dadas as grande perdas que os personagens sofreram no passado, o espectador sabe que ninguém nunca está 100% seguro na trama. Dessa vez, a impressão era que o próprio Mike finalmente seria engolido pela espiral de violência que já custou a vida de sua mãe (no final da segunda temporada) e de seu irmão mais velho (no primeiro episódio da série).

No geral, a quarta temporada de O Dono de Kingstown merece o “prêmio” de série mais depressiva do ano. Mesmo depois de ter algumas vitórias e algumas vinganças nos episódios finais, a impressão que fica é que os personagens perderam muito mais do que ganharam ao longo dessa temporada. E não é uma questão de ter perdido dinheiro ou território, mas sim “itens” insubstituíveis, como entes queridos ou a própria humanidade. Conforme o tempo passa, as fronteiras morais vão ficando cada vez mais fáceis de serem cruzadas e os “mocinhos” da série vão ficando cada vez mais parecidos com os “monstros” que eles estão combatendo.