Crítica: Destacamento Blood

Da 5 Bloods, EUA, 2020



O diretor Spike Lee conta uma história de guerra e reparação que ressoa perfeitamente com o ano de 2020

★★★★☆


O cinema ativista de Spike Lee segue mais relevante do que nunca, e o lançamento de Destacamento Blood coincide com os protestos antirracismo que se espalharam pelo mundo. Apesar das duas horas e meia de duração e da típica prolixidade do diretor, o filme consegue fazer um belo equilíbrio entre política, História e dramas pessoais em uma narrativa sobre guerra, trauma e reparação.

A jornada de quatro afro-americanos veteranos da Guerra do Vietnã de volta ao país serve como guia para se explorar o que significa ser um homem negro defendendo os EUA em uma guerra no exterior. No caso do Vietnã, era uma guerra sem sentido e impossível de ser vencida (como mostrado no filme The Post: A Guerra Secreta, sobre o qual comentei aqui), para a qual eles foram enviados por homens brancos para matar (ou morrer pelas mãos de) asiáticos pobres. E se sobrevivessem, seria apenas para voltar para a pobreza e segregação racial de um país que oficialmente os considerava cidadãos de segunda classe.

Mesmo os momentos mais didáticos de Destacamento Blood são integrados na narrativa de forma coesa e natural, o que nem sempre ocorreu em Infiltrado na Klan, trabalho anterior do diretor. Lee sempre prefere pecar pelo excesso de didatismo do que pelo excesso de sutileza, o que é compreensível dado o impacto que ele busca causar com seus filmes. Isso permite que sua mensagem possa ser compreendida mesmo pela parcela do público que não possui conhecimento sobre os movimentos pelos direitos civis ou sobre a participação de afro-americanos nas guerras do século vinte, que dificilmente é representada em filmes e séries.

O filme também lida com os efeitos traumáticos da guerra sobre os combatentes, especialmente por meio do personagem Paul (Delroy Lindo). Com ele, Lee tenta mostrar como a culpa, o estresse pós-traumático e as dificuldades da vida podem levar uma pessoa ao tipo de comportamento paranoico e autodestrutivo que impede muitos veteranos de guerra de viverem vidas normais.

Paul também sofre de uma dissonância cognitiva que o leva a ser um fiel e xenófobo apoiador de Donald Trump, um presidente apoiado por supremacistas brancos. Nesses aspectos, o filme se assemelha a Operação Fronteira (crítica aqui), outro drama original da Netflix que mostra veteranos de guerra em busca de riqueza e compensação.

Mas, além de um baú cheio de lingotes de ouro, os protagonistas de Destacamento Blood também estão em busca dos restos mortais de Stormin’ Norman (Chadwick Boseman), um soldado exemplar que os guiou em segurança pelas selvas vietnamitas e morreu em combate.

O personagem representa todos os heróis de guerra negros que nunca receberam o reconhecimento e as homenagens comuns aos seus compatriotas brancos. Além disso, ele é um líder respeitado e inspirador, a ponto de exigir que seus companheiros ajam com base na razão ao invés de se entregarem a sentimentos extremos, canalizando a raiva e a frustração para ações com resultados mais construtivos.

Com Destacamento Blood, Spike Lee transforma o que poderia ser um mediano filme de ação em um drama urgente e vibrante, adicionando também uma abordagem documental que dá a produção uma relevância social e histórica. O “pacote” de duas horas e meia pode ser um pouco demais para muitos espectadores, mas o caráter episódico da narrativa facilita para que ele seja assistido em partes. Para quem se interessa pelos temas aqui citados, é um esforço que vale a pena.

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