Crítica: Liga da Justiça

Justice League, EUA, 2017



Filme reforça a possibilidade da recuperação da DC no cinema

★★★☆☆


Liga da Justiça vai direto ao ponto e apresenta mais ação que enrolação. Mais que isso, a narrativa consegue apresentar e desenvolver novos personagens sem deixar o ritmo cair ou se levar a sério demais. O resultado é um filme leve e divertido que, apesar de não ser nada brilhante ou inovador, consegue fazer jus a seu icônico grupo de personagens. Ainda que não saia do nível de “filme genérico de super-heróis”, essa entrada representa mais um passo à frente para o DCEU depois do bem-sucedido Mulher-Maravilha (crítica aqui).

Muito pode-se especular sobre o responsável pela boa forma desse filme, já que o diretor Zack Snyder se afastou da produção depois de sofrer uma tragédia na família. A finalização ficou a cargo de Joss Whedon, um nome de peso na cultura pop graças a um respeitável currículo. O resultado está livre de muitos dos defeitos de Snyder (excesso de câmera lenta, dramaticidade forçada, tempo de duração desnecessariamente longo, foco na forma e não no conteúdo, dentre outros), enquanto encorpora muito da sensibilidade de Whedon. Pode ser que o próprio Snyder tenha trabalhado seus pontos fracos e se superado, mas também é possível que Whedon tenha entrado e “consertado” o filme.

O fato é que o excesso de trama em Batman vs Superman: A Origem da Justiça facilitou o trabalho de quem quer seja que deixou Liga da Justiça bem mais enxuto. O grande problema do capítulo anterior é que ele está mais preocupado em construir um universo cinematográfico (o que deveria ser feito em vários filmes) do que em ser um filme coerente. Uma das mudanças positivas trazidas por Whedon foi a alteração do final de Liga da Justiça, que deixou de ser um cliffhanger e passou a ser mais auto-contido. Resta saber se o estúdio vai levar esse tipo de melhoria em conta nos projetos futuros ou se, mais uma vez, vai deixar tudo nas mãos de um único diretor.

Os elementos dramáticos de Liga da Justiça funcionam bem melhor que os de Batman vs Superman e tão bem (talvez até melhor) quanto os de Mulher-Maravilha. A montagem inicial, que mostra as consequências da morte do Superman/Clark Kent (Henry Cavill) no filme anterior (ao som de um ótimo cover de Everybody Knows), e a cena inicial de Diana/Mulher-Maravilha (Gal Gadot) podem até emocionar os espectadores mais ligados no atual cenário de intolerância e radicalismo que assola o mundo. A diferença é que no mundo real esses problemas geralmente surgem durante períodos de incerteza econômica, enquanto no filme são mostrados como consequência da morte de um herói que simbolizava a esperança.

O reencontro entre Superman e Lois Lane (Amy Adams) também é retratado com bastante autenticidade, apesar de ela não ter muito tempo de tela. O restante do elenco de apoio também faz apenas pequenas participações, o que dá espaço para a narrativa focar no time principal e seus novos integrantes: Aquaman/Arthur Curry (Jason Momoa), Flash/Barry Allen (Ezra Miller) e Ciborgue/Victor Stone (Ray Fisher). Isso funciona muito bem, já que possibilita a criação de sintonia entre os membros da equipe enquanto deixa os coadjuvantes para serem melhor desenvolvidos em eventuais filmes solos dos heróis.

Desses novos integrantes, o único que não funciona muito bem é o Aquaman de Jason Momoa. O ator veio com a proposta de tornar o personagem mais cool, mas acaba exagerando um pouco ao fazê-lo soar como um surfista ou praticante de algum outro esporte radical, o que parece forçado e não combina com a estória dada ao personagem (rebelde herdeiro do trono de um reino submarino cujo único contato com o mundo “moderno” é por meio de uma vila de pescadores). Talvez seja possível torná-lo ainda mais legal se ele parar de gritar “uhuuull!” e “é isso aí!” durante as cenas de ação.

O Batman/Bruce Wayne de Ben Affleck funciona bem o suficiente, porém sua falta de poderes proporciona tanto momentos cômicos voluntários quanto involuntários. Essa é uma dificuldade enfrentada pela maioria dos roteiristas (em várias mídias) que precisam colocar esse personagem ao lado de seres super-poderosos. Enquanto no MCU Tony Stark usa de tecnologias quase mágicas para produzir armaduras que o deixam no mesmo nível que seus colegas, Wayne conta apenas com sua agilidade, alguns gadgets e muita sorte para lidar com as ameaças cósmicas que estão surgindo. A maioria dos fãs já está acostumada com isso, mas eu não seria contra um upgrade (ou algum tipo de re-imaginação) do personagem.

Ainda assim, o personagem consegue não apenas prover o suporte tecnológico para o time, mas também usar tecnologia alienígena para enfrentar os invasores. O que me surpreendeu negativamente nesse sentido foi o típico blá-blá-blá pseudo-científico que esse tipo de filme usa para explicar os elementos fantásticos, que, de alguma forma, não faz o menor sentido mesmo em um filme de fantasia como esse. Em alguns momentos, a impressão é que Affleck entrega as falas o mais rápido possível na esperança de ninguém perceber que ele está apenas soltando palavras aleatórias.

A ação em Liga da Justiça é de tirar o fôlego, com destaque para a batalha entre o vilão Lobo da Estepe (Ciarán Hinds) e as amazonas e para os momentos nos quais ele enfrenta diretamente a Mulher-Maravilha. Os parademônios que compõem o exército do vilão também dão oportunidades para todos os membros da equipe mostrarem do que são capazes. Porém, essas cenas ainda são prejudicadas pela questionável qualidade dos efeitos visuais, que fazem quase tudo parecer de plástico e/ou artificial. Junto com a muitas vezes irritante escuridão da fotografia, esses ainda são problemas com os quais o estúdio terá que lidar no futuro.

Apesar das imperfeições, Liga da Justiça é o segundo filme de super-heróis decente do DCEU, superando com folga tanto Batman vs Superman: A Origem da Justiça quanto o dispensável Esquadrão Suicida (2016). Ele também é um pouco superior a O Homem de Aço e quase chega no nível de Mulher-Maravilha, primeiro acerto da Warner/DC. Isso ainda não é o suficiente para deixar os concorrentes na Marvel preocupados, mas agora há uma chance de reação.

Comentários com SPOILERS

Liga da Justiça possui duas cenas pós-créditos. A primeira é apenas uma divertida homenagem à longa rivalidade entre o Homem de Aço e o Flash como velocistas. Afinal, quem é o mais rápido? A cena mostra apenas as provocações entre os dois e termina quando a corrida se inicia, mas já é um belo presente para os fãs.

Já a segunda é mais elaborada e deixa um considerável gancho para o futuro do DCEU. Inicialmente, é mostrado que Lex Luthor (Jesse Eisenberg) escapou da prisão onde Batman o deixou no fim de Batman vs Superman: A Origem da Justiça. O cenário então muda para um luxuoso iate no qual Luthor aguarda ninguém menos que Deathstroke/Slade Wilson/O Exterminador (Joe Manganiello), o já anunciado vilão de um novo filme solo do Homem-Morcego, The Batman. E Luthor tem uma proposta: “talvez essa seja a hora de criarmos a nossa própria Liga.” Fim da cena.

Logo, além da prometida chegada de Darkseid, que é mencionado uma única vez durante Liga da Justiça, parece que a Liga também terá que lidar com esse novo grupo de vilões. Nos quadrinhos, Deathstroke também é o membro fundador da Sociedade Secreta de Supervilões durante a minissérie Crise Infinita, o que mostra que o DCEU está tentando se aproximar mais de seu material fonte.

E pra quem notou as semelhanças entre Deathstroke e Deadpool, fique sabendo que isso não é acidental: Deadpool foi criado pela Marvel para ser algo como uma paródia do vilão da DC. Além da referência à “morte” em seus nomes de guerra, os personagens também tem nomes reais (Slade Wilson e Wade Wilson), profissão (mercenários sem lealdade a heróis ou vilões), poderes (capacidade de regeneração) e “uniformes” bem parecidos. A grande diferença é que Deadpool é totalmente voltado para a comédia, além de ter se tornado tão popular que já teve várias séries nos quadrinhos e um filme de grande sucesso no cinema, cuja continuação será lançada em 2018.

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