Crítica: Tenet

Tenet, EUA, 2020



Megaprodução é um deleite para os sentidos e um grande quebra-cabeça para o cérebro

★★★★☆


Tenet é, acima de tudo, um grande espetáculo de ação. Tanto a quantidade quanto a magnitude da ação aqui fazem valer a pena o valor do ingresso ou da locação. São sequências de ação tão impressionantes que são satisfatórias mesmo quando o espectador não sabe nem como e nem porque elas estão ocorrendo. O mecanismo de inversão do tempo apresentado pelo diretor Christopher Nolan é tão intrigante que nem mesmo o próprio Nolan foi capaz de montar uma narrativa capaz de apresentá-lo de forma clara o suficiente para o espectador conseguir seguir todos os detalhes da trama.

Se em A Origem ele foi capaz de introduzir o espectador ao mundo dos “invasores de sonhos” com certa facilidade, aqui a história é outra. Mesmo os momentos mais “didáticos” de Tenet são tão apressados e tão complexos que o espectador não tem outra escolha a não ser seguir em frente e tentar entender depois que o filme terminar. Parte disso se deve ao fato de que algumas explicações são feitas com base em conceitos que também não são familiares para o público, como a manobra militar do movimento de pinça. Ela é realizada várias vezes no filme, mas não ao longo do espaço e sim ao longo do tempo (calma, vai ficar mais claro nos próximos parágrafos).

Por outro lado, a trama em si é bem simples e muito similar ao dos últimos filmes da franquia Missão: Impossível (comentário aqui), com um mundo que está mais próximo de HQs e vídeo games do que do mundo real. Há basicamente três tipos de cenas em Tenet: o diálogo no qual o Protagonista (John David Washington) recebe a próxima missão, o diálogo no qual ele e Neil (Robert Pattinson) planejam a missão e, por fim, a execução da missão em si, que é onde entra a ação alucinante acompanhada de uma fantástica trilha sonora. Em alguns momentos, o planejamento e a execução também têm a participação de Mahir (Himesh Patel) e Ives (Aaron Taylor-Johnson), mas nada muito diferente disso.

Dado que o Protagonista passa a maior parte do tempo tentando entender o que está acontecendo, o centro emocional da trama está em Kat (Elizabeth Debicki), esposa do vilão Sator (Kenneth Branagh). Presa no relacionamento altamente abusivo, ela é controlada pelo marido por meio do filho pequeno do casal e de evidências incriminadoras que Sator possui contra ela. Os dois personagens são os mais profundos e realistas da trama, com Sator sendo uma perfeita representação de homem inseguro, violento, egocêntrico e possessivo, incapaz de levar em conta as experiências e necessidades das outras pessoas.

O que torna os movimentos de pinça de Tenet tão difíceis de representar e acompanhar é o fato de que há sempre duas equipes indo em direções opostas no tempo. Por exemplo, uma Equipe A que encara o tempo de forma convencional começa a missão no Momento 1 e a termina no Momento 100. Por outro lado, há uma Equipe B que começa a missão no Momento 100 e a termina no Momento 1, pois para ela o tempo passa de trás para frente. Dessa forma, no Momento 1 a Equipe B, que já passou pelos acontecimentos da missão, informa a Equipe A sobre o que está prestes a acontecer, dando-a a vantagem de conhecer o futuro. O grande problema é que durante a ação as duas equipes estão ao mesmo tempo no “campo de batalha”, e fica difícil acompanhar quem está indo em qual direção temporal.

Além disso, em determinado ponto a direção temporal do filme muda e os personagens passam a ir rumo a eventos do passado, o que resulta em momentos fantásticos e altamente satisfatórios para o público. Talvez o espectador que já conhece a série Dark (resenha aqui) terá uma maior facilidade para entender a lógica da “inversão” de pessoas e objetos em Tenet, pois, uma vez que ela ocorre, o que mais importa não é o tempo linear, mas sim a ordem dos acontecimentos vividos pelos personagens. Assim como na série, é possível desenhar a passagem não-linear do tempo conforme o ponto de vista de personagens específicos.

Com performances eletrizantes de Washington, Pattinson, Debicki e Branagh, Tenet é uma empolgante experiência sensorial e cerebral, ainda que seja desprovido do impacto emocional comum em outras obras de Nolan, como Interestelar e Dunkirk (crítica aqui). Se o diretor e o estúdio tivessem esperado mais, o filme seria uma grande “fábrica” de dinheiro, já que ele possui muitos elementos que justificariam múltiplas idas ao cinema. Porém, a produção foi usada para testar o mercado das salas de exibição durante uma pandemia e vem amargando resultados decepcionantes nas bilheterias.

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