Crítica: Planeta dos Macacos – O Confronto

Dawn Of The Planet Of The Apes, EUA, 2014



Mais ação e mais inteligência nessa ótima continuação

★★★★☆


Planeta dos Macacos: O Confronto possui tantos destaques que nem sei se podemos considerá-lo apenas um blockbuster do verão americano. Ele certamente pode ser encaixado nessa categoria se levarmos em conta a quantidade e grandiosidade de suas cenas de ação. Outro ponto a favor dessa categorização é a qualidade de seus muitos efeitos visuais, a ponto de você esquecer que aqueles não são macacos de verdade falando, lutando e entrando em guerra contra os humanos. A imersão é completa e isso muito contribui para que levemos a sério uma trama adulta e simbolicamente significativa. E é aqui que o longa começa a ir além do esperado. Mais do que passar uma mensagem pacifista, a trama consegue capturar muitos dos elementos que dão origem aos conflitos do nosso mundo, levando em conta tanto as questões pessoais quanto as necessidades coletivas que podem dar origem a uma zona de conflito. A guerra não é retratada como uma questão de agressor contra agredido, ou quem está certo e quem está errado, mas sim como uma tragédia alimentada por intolerância, por rancor e pelos sentimentos de direito e superioridade existentes nos dois lados. Mais do que um blockbuster, “Planeta dos Macacos: O Confronto” cumpre seu papel como ficção científica.

Não me lembro precisamente do final de Planeta dos Macacos: A Origem, mas acredito que era de se esperar que após o confronto entre humanos e macacos ocorrido na Golden Gate a relação entre os dois lados seria marcada por mais confrontos diretos. Mas, a princípio, não é isso o que acontece. Os macacos se isolam no bosque nos arredores de São Francisco e criam algo como uma civilização idílica, uma mega tribo que consegue viver sem tecnologia ou muita sofisticação. Enquanto isso, a civilização humana entra em declínio. O mesmo vírus que deu aos macacos a capacidade de raciocinar é letal e altamente contagioso para a maior parte da humanidade, o que leva ao pânico generalizado, paranoia, conflitos, e a eventual queda da civilização. Apenas as pessoas geneticamente imunes ao vírus sobrevivem. Um grupo dessas pessoas consegue se reorganizar em São Francisco, mas rapidamente um dos seus principais recursos entra em vias de esgotamento e a única fonte confiável se encontra no território dos macacos. É daí que surge o conflito.

A tribo dos macacos continua sendo liderada por Caesar (Andy Serkins, em atuação notável), agora um líder sábio e experiente. Os macacos dessa primeira geração pensante conseguem estabelecer suas famílias e levam suas vidas em prol da comunidade. Porém, alguns deles ainda carregam os traumas e cicatrizes da época em que estavam trancados em laboratórios e sendo utilizados como cobaias para experimentos. Isso alimenta a desconfiança e o rancor em relação aos humanos, o que são fatores determinantes para a eclosão do conflito. Paralelamente, desesperados, os humanos se veem no direito de simplesmente tirarem os “animais” de seu caminho e começam a se armar para conquistarem os recursos dos quais precisam. Essa “preparação” acaba alimentando as desconfianças do rancoroso macaco Koba (Toby Kebell) e minando os esforços diplomáticos do humano Malcolm (Jason Clarke). É interessante perceber como esse esforço diplomático tinha o potencial para propiciar o início de um convívio harmonioso entre os dois lados, mas o rancor e o sentimento de superioridade acabam levando a tragédia do conflito. Isso emula perfeitamente muitos dos focos de conflito que existiram e ainda existem no mundo, tanto na Europa como no Oriente Médio e em alguns países africanos.

O filme funciona também em um nível político. Apesar da prática diplomática, o conflito eclode graças a um ataque de bandeira falsa, no qual algum agente interessado no surgimento do conflito entre dois lados em tensão efetua um ataque a um dos lados para que este acredite que o lado rival o atacou. Além disso, nota-se o quão dependente de uma liderança forte a massa de macacos pode ser. Em determinado momento, o destino de todos eles é determinado pela disputa entre dois líderes. Para mim, falando do mundo real, isso apenas evidencia a importância de cada ser humano ser inteligente e independente o suficiente para não depender de líderes fortes para conduzir a nossa civilização. Não é uma questão de dizer que não deveriam existir governos centrais, mas sim construí-los a partir da cooperação ao invés de embates sobre quem é o mais forte ou o mais apto para conduzir a sociedade. Ao invés de uma ou mais pessoas inteligentes no topo, precisamos de inteligência em todos os níveis.

Ainda indo além do puro entretenimento, “Planeta dos Macacos: O Confronto” retrata os horrores de um conflito armado: o caos, os mortos e feridos sendo carregados pelo campo de batalha, a fragilidade da população civil, a brutalidade com a qual são tratados os prisioneiros de guerra. Ao mesmo tempo que bebe da fonte das batalhas épicas de filmes fantasia, as batalhas aqui também se inspiram na crueza dos campos de batalha do mundo real. A perseguição aos sobreviventes do lado derrotado também são muito bem emuladas, apesar de poupar o espectador da indescritível violência que ocorre nas zonas de conflito reais. Algumas das cenas de ação são bela- e tragicamente filmadas e irão ficar com o espectador mesmo após a sessão.

Por fim, é interessante notar como o estúdio evolui cuidadosamente a franquia, sem se apressar em chegar logo ao chamado “Planeta dos Macacos”. Tanto a trama quanto a inteligência dos macacos vão evoluindo de forma lógica, o que evita que o filme vire uma simples fantasia sobre “macacos falantes” (nesse capítulo, a maioria deles se comunica via linguagem de sinais). Isso é bom tanto para os cofres do estúdio, já que a franquia tem potencial para gerar muitos filmes de sucesso comercial, como para a qualidade e relevância da história. Nos tempos em que vivemos, essa série de filmes tem o potencial de levantar muitos questionamentos importantes para o futuro da nossa própria sociedade.

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