Crítica: Ford vs Ferrari

Ford v Ferrari, EUA, 2019



Ford vs Ferrari garante que os nomes de Carroll Shelby e Ken Miles não serão esquecidos tão cedo na História do automobilismo

★★★★☆


Apesar de jamais sair do modo automático, Ford vs Ferrari impressiona com fantásticas sequências de corrida intercaladas com uma interessante trama no mundo dos negócios. O diretor James Mangold transporta o espectador não apenas para dentro de carros em alta velocidade mas também para o mundo do automobilismo nos anos 1960. Os elementos mais previsíveis da narrativa e da história real sendo contada são compensados pelo aspecto imersivo das cenas de ação e pelas ótimas atuações de todo o elenco.

O filme não chega a ser uma experiência tão completa como Rush: No Limite da Emoção, mas possui o mesmo nível de intensidade e alguns paralelos com ele. Além de serem baseados em histórias reais, os dois filmes são centrados no relacionamento entre dois grandes nomes do automobilismo, com uma diferença: enquanto o thriller de Ron Howard gira em torno da rivalidade entre Niki Lauda e James Hunt, Ford vs Ferrari foca na amizade entre Carroll Shelby (Matt Damon) e Ken Miles (Christian Bale).

Se Miles é um esquentado e impulsivo piloto de meia idade que está passando por problemas financeiros, Shelby é um ex-piloto que se vira como pode vendendo carros esportivos. A genialidade bruta e inconsequente do primeiro é compensada pela calma estratégica e diplomática do segundo. Eles não apenas se entendem, mas se complementam em muitos aspectos.

A sorte deles muda quando Henry Ford II (Tracy Letts), CEO da Ford Motor Company, decide entrar com tudo no mundo da alta velocidade, especialmente depois de ser usado e insultado por Enzo Ferrari (Remo Girone). Shelby é encarregado de montar um carro para vencer a imbatível Ferrari nas 24 Horas de Le Mans de 1966 e escolhe Miles para ser seu piloto.

Pode-se dizer que o conflito no centro de Ford vs Ferrari não é entre pilotos ou mesmo entre as duas montadoras do título, mas sim entre os homens que estão nas pistas e aqueles que estão pagando a conta. Durante a maior parte do filme, as decisões corporativas tomadas por Ford II e seus executivos mais atrapalham do que ajudam os engenheiros e pilotos. A maior desavença está na escalação de Miles, que é visto como uma figura imprevisível que pode acabar causando problemas diante das câmeras.

Esse é um conflito de objetivos e prioridades. Enquanto a Ford está mais interessada no marketing positivo que uma vitória traria, Shelby e Miles estão mais interessados em superar a si próprios e em escrever seus nomes na História. Se Ford II quer humilhar a Ferrari e alavancar as vendas, Miles quer alcançar uma elusiva “volta perfeita”.

Sua obsessiva busca por mais velocidade e mais vitórias está mais ligada aos mistérios da natureza humana do que com a busca por sucesso financeiro. Ao contrário dos limitados e conservadores executivos, a cada vez que entra em um carro Miles está fazendo uma aposta de vida ou morte. Talvez o objetivo dele não seja simplesmente vencer a corrida, mas sim testar os limites da própria mortalidade, olhando a morte direto nos olhos e depois voltando para o mundo dos vivos.

É claro que nem sempre é possível voltar.

Com atuações memoráveis, uma incrível reconstrução de época (especialmente da Califórnia dos anos 1960, que fica quase tão boa quanto a feita em Era Uma Vez em Hollywood) e alucinantes cenas de ação, Ford vs Ferrari já está dentre os maiores filmes de automobilismo da História, ao lado tanto de Rush: No Limite da Emoção quanto do clássico Grad Prix, do diretor John Frankenheimer (que também dirigiu Ronin, thriller de ação que se destaca por suas cenas de perseguição). O filme é muito bem-sucedido em homenagear e eternizar a história de duas grandes figuras do esporte e garantir que Shelby e Miles não serão esquecidos tão cedo.

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