Crítica: As Golpistas

Hustlers, EUA, 2019



Em “As Golpistas”, um grupo de strippers decide empreender de forma um pouco mais ousada e vai longe demais

★★★☆☆


A diretora Lorene Scafaria mostra ousadia e segurança na condução de As Golpistas, apesar do resultado final não atingir a grandiosidade narrativa que ela parece almejar. Os ingredientes necessários para tal estão todos presentes, mas são combinados de uma forma que diminui o impacto de cada um deles. Talvez tenha faltado um pouco de foco ou ainda mais extravagância, o que deixaria a produção mais próxima da intensidade de um O Lobo de Wall Street do que da fastiosidade de um Oito Mulheres e um Segredo.

Os melhores momentos do filme são aqueles nos quais vemos a evolução da amizade entre Destiny (Constance Wu) e Ramona (Jennifer Lopez), que passa por altos e baixos ao longo da trama. Por mais que em alguns momentos elas entrem em conflito, o sentimento que as une sempre prevalece, mesmo quando uma decepciona a outra. A narrativa seria muito mais sólida se tivesse focado ainda mais na relação entre elas, especialmente quando as coisas começam a sair do controle.

Se inicialmente o grupo de strippers liderado por Ramona mira nos intocáveis “senhores do universo” de Wall Street, com o passar do tempo elas vão ficando menos seletivas e mais agressivas com suas vítimas. O esquema que elas montam para embebedar e roubar milhares de dólares de seus clientes funciona tão bem que elas perdem a perspectiva dos crimes que estão cometendo. Assim como no caso dos operadores do mercado financeiro, enquanto a grana vai aumentando, os escrúpulos vão diminuindo, a ponto delas se esquecerem de que não são tão intocáveis quanto eles.

Nesse aspecto, o filme dialoga com Parasita (crítica aqui), sucesso sul-coreano que vem conquistando prêmios e elogios ao longo de 2019. O que os dois filmes deixam claro é que a desigualdade social não se trata apenas de quem tem muito e de quem tem muito pouco, mas também de quem pode conseguir muito e de quem não tem condições de subir na vida. Diante de um cenário no qual não há uma verdadeira igualdade de oportunidades, aqueles que estão na base da pirâmide vão recorrer a quaisquer meios possíveis tanto para sobreviver quanto para aumentar os próprios padrões de vida.

Como um drama de crime focado em mulheres, a produção também lembra o suspense As Viúvas (crítica aqui) e a história de máfia de Rainhas do Crime (crítica aqui). Dentre os três, As Golpistas é o único baseado em eventos reais.

Enquanto Constance Wu mostra que tem talento suficiente para protagonizar uma produção como essa (apesar das polêmicas dos bastidores), é Jennifer Lopez que se torna o centro gravitacional da atenção do espectador. A cena na qual Ramona é apresentada estabelece a personagem por meio de sua técnica e exuberância no pole dance, misturando poder e ganância com luxúria e sensualidade. É um momento digno dos clipes de Pour It Up, de Rihanna, e de Money, de Cardi B (que também está no elenco do filme e na trilha sonora do primeiro trailer).

Apesar de imperfeito e incompleto, As Golpistas oferece um cativante e informativo olhar sobre o mundo das strippers, especialmente sobre como a Crise Financeira de 2008 as afetou em Nova York. Seu escopo ficaria mais interessante se também tivesse explorado as relações de poder nesse mundo: tanto a dançarina quanto o cliente acham que estão no controle, mas talvez nenhum dois esteja. Isso me lembra uma das falas do filme O Capital: “As pessoas acham que o dinheiro é uma ferramenta. Estão erradas. O dinheiro é o mestre.”

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